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Ilusão 3: O CEO super-herói

O mito da liderança infalível e a subestimação da sorte


A crença de que conseguimos compreender plenamente os acontecimentos do passado costuma alimentar outra ilusão igualmente poderosa: a de que podemos prever e controlar o futuro. Essas ilusões funcionam como uma espécie de calmante psicológico. Elas diminuem a ansiedade que sentiríamos se aceitássemos, de fato, o quanto o mundo é incerto e incontrolável. Por isso, muitos livros de negócios são moldados para oferecer essa sensação de segurança: explicações simples, exemplos de sucesso e a ideia reconfortante de que liderar com as “melhores práticas” garante resultados.

De fato, a liderança influencia o desempenho de uma empresa. CEOs tomam decisões importantes, definem estratégias e implementam mudanças. No entanto, estudos mostram que o impacto real da figura do CEO nos resultados das organizações é muito menor do que a narrativa dominante costuma sugerir.


O que dizem os estudos sobre CEOs e desempenho empresarial?


Segundo Daniel Kahneman pesquisas analisaram o desempenho de empresas antes e depois da chegada de novos CEOs. Foram observadas suas estratégias, decisões administrativas e práticas adotadas. O que os dados indicam é que, sim, há influência da liderança — mas essa influência é bem mais modesta do que aparenta nos discursos da mídia ou nos best-sellers de gestão.

Um dos estudos mais elucidativos comparou pares de empresas semelhantes: em cada par, uma contava com um CEO considerado excelente, e a outra, com um CEO de desempenho considerado inferior. Em um mundo completamente previsível, seria de se esperar que a empresa com o “melhor” CEO vencesse 100% das vezes. Mas não é isso que acontece no mundo real.

Por conta de fatores aleatórios, complexos e incontroláveis, o que os pesquisadores descobriram é que, em cerca de 50% das vezes, a empresa com o “CEO inferior” também se saiu melhor. Em uma estimativa otimista, a correlação entre a qualidade percebida de um CEO e o sucesso da empresa chega a, no máximo, 0,30. Isso significa que um bom CEO pode estar à frente da empresa mais bem-sucedida apenas em 60% dos casos comparativos.

Esses números mostram que a liderança, embora relevante, não é a protagonista absoluta do sucesso empresarial — e certamente não justifica o culto ao “CEO super-herói” tão comum nos livros de negócios e no imaginário popular.

Sorte, contexto e variáveis invisíveis

Grande parte dos resultados de uma empresa depende de eventos aleatórios ou externos ao controle da liderança: condições de mercado, inovações inesperadas, crises econômicas, flutuações políticas, concorrência agressiva — tudo isso pode afetar o desempenho, independentemente da competência do CEO.

A ideia de que um único indivíduo carrega o destino da empresa nas costas é uma narrativa sedutora, mas profundamente falha. O sucesso empresarial é quase sempre fruto de um conjunto de variáveis interligadas — entre elas, a sorte desempenha um papel maior do que estamos dispostos a admitir.

O culto ao “CEO super-herói” é, portanto, mais uma construção narrativa — útil para vender livros e inspirar plateias, mas perigosa se nos faz ignorar a incerteza, o acaso e o trabalho coletivo.


📚 Referência:KAHNEMAN, Daniel. Rápido e Devagar: Duas Formas de Pensar. Rio de Janeiro: Objetiva, 2012.


Autor: Renato Baldissera Economista e estudioso do comportamento humano nas relações de trabalho, consumo e gestão. Criador da Capital Interno.

 
 
 

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1 comentário

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Rene Gonzatti
Rene Gonzatti
11 de jul.
Avaliado com 5 de 5 estrelas.

Eu, era um que acreditava que a sorte tinha um peso pequeno nas nossas vidas.

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